Para início de conversa quero destacar o significado palavra discípulo, que quer dizer aluno, aprendiz, seguidor, aquele que dá seguimento ao trabalho do seu mestre. Com essas definições podemos pontuar muitas questões para nossa reflexão acerca do nosso discipulado cristão. Como membros da Igreja, Corpo místico de Cristo, nos tornamos instrumentos da ação divina no mundo, somos convidados e impulsionados pelo Espírito Santo a ser verdadeiros continuadores da missão de Jesus que é levar a todos o Evangelho da salvação, ou seja, a Igreja é enviada por Deus a todas a gentes para ser “sacramento universal de salvação (Lumen gentium, 48), por intima exigência da própria catolicidade, obedecendo a um mandato do seu fundador (Mc 16,15) procura incansavelmente anunciar o Evangelho a todos os homens.” (Ad Gentes, 1)[1]
O divino Mestre constantemente nos
convida a sermos seus seguidores, “Vem e segue-me”, isso aconteceu com Mateus[2] que deixou a coletoria de
impostos para seguir a Jesus, aconteceu com Pedro e André[3] que deixaram o barco e as
redes para se tornarem pescadores de homens, aconteceu com as multidões[4] que o seguia em busca de
milagres. Cada um a seu modo e de seu jeito se torna seguidor de Jesus, mas uma
característica muito interessante do discípulo é ser aquele que dar
continuidade ao trabalho do seu mestre, neste sentido o discípulo também é
missionário, ele não guarda para si os ensinamentos e experiências vividas, mas
trona-se propagador de toda graça que recebeu.
Contemplando o mistério da
anunciação e encarnação de Jesus, encontramos na figura da Virgem Maria um
modelo especial de discípula e missionária, certamente Maria tinha seus
projetos de vida, mas em determinado momento de sua história ela é surpreendida
pelo divino convite de ser a mãe do Salvador[5], diante do chamado de Deus
ela responde prontamente que estar disponível como humilde serva para viver a
vontade do seu Senhor. Ser discípulo-missionário é também reconhecer que sozinhos
não somos nada e por isso nossa vida pertence a Deus e somente a Ele devemos
entregar tudo o que somos e temos para que o seu Reino de amor seja construindo
aqui e agora, reino esse que viveremos na eternidade, mas que já se antecipa
por ação da misericórdia do Senhor.
A Virgem Maria tendo recebido tão
grande graça se coloca a serviço de sua parenta[6] e sua ação missionária
transmite também para Isabel e a criança que estava no seu vente o Espírito
Santo. Quando assumimos nossa missionariedade também nos tornamos canais do
Espírito Santo para tantos irmãos e irmãs que necessitam de nossa ajuda e da
graça de Deus. Maria sempre seguiu seu amado Filho, esteve ao seu lado desde
seu nascimento até sua Paixão, morte e ressurreição, o verdadeiro discípulo
permanece junto a seu mestre mesmo quando as coisas parecem difícil, a
confiança em Deus deve sempre nortear nossa caminhada missionária, pois se com
Cristo morremos, com ele também ressuscitaremos[7], aquele que perseverar até
o fim será salvo[8].
As vezes pensamos que somente é
missionário aquele que deixa tudo e vai para outro país ou regiões viver a
missão Ad gentes, como fez São Francisco Xavier, Santo Antônio de Pádua,
São José de Anchieta, São Maximiliano Maria Kolbe, Santa Paulina, São João
Paulo II, Santa Teresa de Calcutá, Irmã Dorothy, Dom Pedro Casaldáliga, Drª.
Zilda Arns e muitos outros que doaram sua vida a serviço dos irmãos e irmãs
vivendo a caridade e evangelizando em prol do Reino de Deus. Mas também podemos
ser missionários no dia a dia e nas pequenas coisas, podemos e devemos exercer
nosso ministério missionário em casa com nossa família, na escola, na
universidade, no trabalho, em nossa rua com nossos vizinhos, em todos os
lugares que passamos. Santa Teresinha do Menino Jesus foi uma monja carmelita francesa
que morreu com apenas vinte e quatro anos de idade, entrou no convento com
quinze anos, sempre se dedicou a oração pela Igreja e pelos missionários, anos
depois de sua canonização ela foi proclamada padroeira das missões juntamente
com o grande missionário São Francisco Xavier, a diferença entre ela e
Francisco é que Teresinha nunca foi para a missão no meio do povo, mas fez de
sua vida uma missão, aquilo que estava a seu alcance ela entregou totalmente a
disposição do projeto de Deus e se sacrificou para que suas orações e penitências
pudessem fortalecer a todos os missionários espalhados no mundo inteiro.
Santa Teresinha tinha um grande ardor
missionário, certa vez ela escreveu: “Ah! apesar da minha pequenez, queria
iluminar as almas como os profetas, os doutores. Tenho a vocação de apóstolo...
Gostaria de correr a terra, propagar teu nome e fincar tua Cruz gloriosa no
solo infiel. Ó meu amor, uma missão só não seria suficiente. Gostaria também de
pregar o Evangelho nas cinco partes do mundo, até nas mais longínquas ilhas...
Queria ser missionária, não só durante alguns anos, mas gostaria que fosse
desde a criação do mundo e até o final dos séculos... Mas, sobretudo, meu
Bem-Amado Salvador, quero derramar meu sangue para Ti até a última gota...”[9], parecia que humanamente
esse desejo de Teresinha era impossível, mas ela unida ao Coração de Jesus
descobriu que poderia ser missionária nas pequenas coisas, sendo gentil com
suas irmãs no convento, fazendo penitência pela santificação dos sacerdotes,
rezando por todos os que estavam em missão. Ela descobriu que na vocação de
discípulo-missionário estava a necessidade de entrar na escola do Coração de
Jesus e aprender com ele que é manso e humilde[10] a sermos imagem e
semelhança[11]
do Amor, pois Deus é amor[12], compreendendo isso ela escreveu:
“Sim, achei meu lugar na Igreja e esse lugar, meu Deus, fostes vós quem o
destes a mim... no Coração da Igreja, minha Mãe, serei o Amor... serei tudo,
portanto... desta forma, meu sonho será realizado!”[13]. Essa é a nossa grande
missão, viver o amor, ser presença de Deus na vida de todas as pessoas, seja
nas grandes missões ou no cotidiano de nossa realidade.
Temos muitos exemplos de pessoas que
viveram sua missão a partir de sua realidade, mas quero destacar Santo Aníbal
Maria Di Francia que dedicou sua vida e seu ministério sacerdotal para cuidar
dos pobres e órfãos de sua região, ele não foi a lugares longe, mas encontrou perto
de si pessoas que necessitavam de ajuda material e também espiritual, ele se preocupava
muito em acudir a todos os famintos, mas também se preocupava com o alimento celestial
e por isso viveu o carisma do ROGATE que é suplicar ao Senhor da messe e Pastor
do rebanho que envie mais operários e operárias para sua messe[14] e nós hoje somos esses
operários/discípulos/missionários que o Senhor continua chamando e enviando
para sua messe.
O discípulo enviado em missão leva
aos seus irmãos o amor e a graça de Deus, mas só podemos viver verdadeiramente
essa missão se estamos totalmente ligados a aquele que nos enviou, é necessário
manter uma relação de intimidade com o Senhor, saber que podemos inclinar nossa
cabeça no peito de Jesus[15] e sem medo apresentar
nossas dúvidas e limitações bem como colocar a disposição d’Ele os nossos bens
e talentos, é acreditar que mais que servos somos amigos do Senhor[16], que não exercermos a
missão como obrigatoriedade ou por receio de uma possível punição, mas que o
fazemos porque amamos a Deus e aos nossos irmãos e irmãs[17]. Para alimentar essa
intimidade espiritual temos muitas possibilidades, entre elas a meditação das
Sagradas Escrituras, a Palavra de Deus deve penetrar nosso coração para que
nossas ações correspondam a vontade daquele que nos chama e nos envia, também a
vivência na comunidade eclesial nos coloca como pertencentes ao Corpo de
Cristo, desse modo unidos na comunidade estaremos unidos a Jesus como os ramos
estão unidos a videira[18], a experiência
sacramental também exprime em nós a presença de Cristo, de modo especial a
Eucaristia que nos alimenta nos fortalece para a missão, é na mesa eucarística
que podemos reconhecer Jesus como aconteceu com os discípulos de Emaús[19] que após meditarem sobre
as Sagradas Escrituras e o partir do pão saíram para anunciar que Jesus ressuscitou.
A
Eucaristia é o lugar privilegiado do encontro do discípulo com Jesus Cristo.
Com este Sacramento, Jesus nos atrai para si e nos faz entrar em seu dinamismo
em relação a Deus e ao próximo. Existe estreito vínculo entre as três dimensões
da vocação cristã: crer, celebrar e viver o mistério de Jesus Cristo, de tal
modo que a existência cristã adquira verdadeiramente forma eucarística. (DA,
251)[20].
Para encerrar nossa meditação quero
voltar a passagem do evangelho que narra o momento em que Pedro e André
deixaram o barco e as redes para seguir Jesus, deixo como reflexão para nossos
momentos orantes as seguintes questões: 1) Quais são os barcos e redes que
preciso deixar para poder verdadeiramente seguir Jesus como
discípulo-missionários? 2) Pedro e André tornaram-se pescadores de homens, como
eu posso hoje ser também pescador de homens e mulheres para o Reino de Deus? 3)
Mesmo não podendo ir a lugares longínquos, como posso lançar as redes em águas mais
profundas[21]
como fizeram os grandes missionários da Igreja?
Não tenhamos medo de assumir nossa
missão, o mesmo Jesus que nos enviou para pregar o Evangelho a todas as
criaturas também prometeu permanecer conosco até o fim dos tempos[22],
sigamos com fé a Jesus e sejamos como Ele missionários do Amor, propagadores da
Boa Nova. Deus nos abençoe sempre!
[1] Documento
do CVII.
[2] Mt
9, 9-13.
[3] Mt
4, 18-22.
[4] Mt
8, 1-13.
[5] Lc
1, 28-38.
[6] Lc
1, 39-45.
[7] Rm
6,8.
[8] Mt
24,13.
[9]
História de uma alma – Autobiografia de S. Teresinha.
[10] Mt
11, 28-30.
[11]
Gn 1, 26.
[12]
1Jo 4,8.
[15]
Jo 13,25.
[16]
Jo 15, 14-15.
[17] Mt
22, 37-39.
[18] Jo
15, 1-17.
[19]
Lc 24, 13-25.
[20]
Documento de Aparecida.
[21] Lc
5, 1-11.
[22] Mt
28, 16-20.
Fonte da imagem: https://th.bing.com/th/id/R.ae77a048e307d7f8d8cfefb991e17df0?rik=mmaaa%2b8vE2vpdQ&riu=http%3a%2f%2f3.bp.blogspot.com%2f-xuuJ0QJnmNQ%2fUx8BiCFw2dI%2fAAAAAAAABi0%2fvlO2dkp12aQ%2fs1600%2fandr%C3%A9%2c%2c%2c.jpg&ehk=BRjd0xIOzwWY2Mq6DgtbsI03%2fYK2EoW%2bDZjlMsWo0C0%3d&risl=&pid=ImgRaw&r=0